Se
tem um lugar em um shopping onde é possível encantar o frequentador é o
estacionamento. É lá que começa a experiência dele com o empreendimento
Por Camila Mendonça*
Estacionamento é um espaço destinado a carros. Ou é um
espaço vazio, que poderia ser melhor aproveitado, ocupado pela cidade da melhor
forma possível e, de preferência, com intervenções artísticas. É dessa forma
que a arquiteta e designer italiana Teresa Sapey, com escritório em Madri,
enxerga o espaço, que ela chama de não-lugar, e por isso decidiu transformar muitos estacionamentos em
oficina – espaço com grandes obras artísticas: são cores, mensagens,
instalações cuja ideia, disse ela a um site de arquitetura, é apelar para o
emocional do indivíduo. Teresa conseguiu enxergar no estacionamento mais do que
um espaço para carros, mas um lugar onde as pessoas se relacionam.
Conhecida como madame
parking, apelido que lhe foi conferido pelo colega inglês Norman Foster, um
dos grandes nomes da arquitetura mundial, Teresa começou a incrementar
estacionamentos com o objetivo de reinventá-los e jogar cores num ambiente
comumente cinza. Entre os seus projetos de estacionamento destaca-se o primeiro
deles, a garagem do Hotel Puerta America de Madri, que contou com arquitetos
famosos para reformular seus espaços. E o estacionamento ficou a cargo de
Teresa. O trabalho lhe valeu um prêmio de arquitetura em 2005. E além do local
ganhar cores e design diferenciado, também virou badalação. O estacionamento do
hotel abriga festas, casamentos e desfiles, por exemplo, e foi até palco do
lançamento da marca de vinhos da cantora Madonna.
A busca por ambientes emocionais levou a arquiteta a se
inspirar na obra “A Divina Comédia”, de Dante Alighieri, para criar o
estacionamento subterrâneo da Plaza Vázquez de Mella, também na capital
espanhola, pintando-o nas cores preto e vermelho. Outro projeto de destaque é o
estacionamento municipal de Valência (Espanha), considerado o primeiro
ecológico do mundo.
Num shopping center, os estacionamentos podem não ter
as cores e inspirações da arquiteta italiana, mas não deixam de ser um lugar
importante para o relacionamento entre o empreendimento e seu frequentador. Mais
do que sinônimo de conveniência, o estacionamento de um empreendimento é o
início e o fim da jornada de experiência do frequentador. E também é uma fonte
de receita para o shopping. Segundo dados da Abrasce, do total de shoppings no
País, 78% cobram pelo estacionamento. O espaço só perde em receita para os
alugueis: em 2014, o estacionamento representou 13% da receita consolidada do
setor, que foi de R$ 142,3 bilhões. Ao todo, são 823.224 vagas no País. Diante
disso tudo, não é à toa que os empreendimentos têm investido cada vez mais em
oferecer uma experiência de alto nível assim que o frequentador chega. “Hoje o
principal motivo para investir, além de atender às necessidades legais, é o
retorno financeiro. Com a maior concorrência, o nosso maior desafio é
contribuir gerando novas experiências e, assim, ajudar na fidelização dos
clientes”, afirma Fernando Simões Braz, diretor do Portal Parking.
“Por muitos anos, a imagem do estacionamento esteve
associada a um ambiente pouco agradável, que gerava estresse para os clientes e
problemas operacionais para os administradores”, resume Felipe Ferreira,
gerente de marketing e sales da WPS. Ele conta que essa melhora na experiência
passa pela automatização dos processos para além da emissão do tíquete,
pagamento e controle de saídas. “Para solucionar os problemas dos
empreendimentos, o sistema de estacionamento precisa se integrar às operações
presentes no shopping. Se existe uma academia, por exemplo, o sistema precisa
proporcionar uma integração em que o aluno possa validar seu tíquete”, explica.
“Da mesma forma, o sistema de estacionamento precisa se integrar aos sistemas
de gestão das grandes administradoras, pois elas precisam ter uma visão macro e
estratégica de todos os seus empreendimentos”, considera.
A conveniência e uma boa experiência, segundo Pedro
Donda, presidente do Sem Parar, passa por manter o fluxo de carros. “As
administradoras buscam soluções que funcionem com velocidade para suportar o
fluxo intenso dos períodos de pico e que permitam uma gestão operacional em
tempo real”, explica. Segundo Donda, como o estacionamento é o primeiro contato
que o frequentador tem com o empreendimento, a experiência deve ser maximizada.
“O shopping center deve aproveitar todo o tempo que o cliente estiver em seu
ambiente para compras e lazer. Filas e a inconveniência de pagar antes de sair devem
ser eliminadas”, avalia. Um dos projetos de maior sucesso da empresa é o
GValet, que faz a gestão de toda a operação da área VIP do estacionamento,
desde o recebimento do veículo pelo manobrista até a sua entrega ao cliente. A
solução mapeia o pátio para identificar a localização do veículo estacionado e,
na área de espera, os monitores exibem quais veículos que estão
Hoje a companhia, que está presente em 233
estacionamentos de 12 Estados brasileiros, estuda introduzir uma plataforma mobile. “Investir nesse segmento é
fundamental em função do desafio operacional que apresenta. O giro médio de um
shopping é de cem mil veículos por mês, ao passo que uma garagem comum de
cidade tem cinco mil. Tal diferença de porte demanda esforços específicos para
gerir essas operações”, reforça Valdeci Ferreira, gerente operacional da
MultiPark. Para ajudar a resolver esses desafios, a companhia intensificou o
investimento em estações de pagamento automático em todos os 38 shoppings onde
opera.
Tecnologia
Pela facilidade e conveniência, toda e qualquer solução
mobile é hoje a bola da vez quando se
fala em tecnologia de estacionamento. De acordo com Gilberto da Silva, diretor
da ParkEyes, a mobilidade é a maior demanda dos empreendimentos. “Como fator de
satisfação do cliente e, principalmente, de benefícios ao administrador, por
conhecer melhor os seus parâmetros de controle e planejamento, como frequência
de ocupação, permanência e, principalmente a evasão de receita e as reclamações
sem fundamento”, afirma. Além disso, a mobilidade reduz a busca do frequentador
por uma vaga. Segundo o executivo, essa queda chega a ser de até 80%, porcentual
que se reverte em mais tempo no mall.
Há quem já se preocupe com isso. O JK Iguatemi, por
exemplo, lançou um aplicativo de pagamento de estacionamento em parceria com o
PayPal. Depois de baixar o aplicativo e se cadastrar, o frequentador deve
digitar o número do cartão de estacionamento ou escanear o QR Code para efetuar
o pagamento ali mesmo. A MultiPark desenvolveu um aplicativo que informa
preços, horários de funcionamento, taxas de ocupação em tempo real de todos os
seus estacionamentos e que também permite a reserva de vagas em estacionamentos
selecionados. “O aplicativo da MultiPark passará a pagar tíquetes já
abertos de shopping centers, evitando filas e criando mais uma opção de
pagamento ao cliente”, informa Mario Coutinho, gerente de marketing da
empresa.
“Um dos
diferenciais neste momento é a capacidade de atender a grande demanda exigida
pelos shoppings”, afirma Felipe. Para atender a tantas exigências, os
principais projetos da empresa consideram os conceitos de mobilidade, wireless, novos gadgets e a forma como os clientes se relacionam com eles. A
companhia deve lançar soluções como pagamento via celular, entrada sem tíquete,
somente com leitura das placas dos veículos, pagamento de todas as idas ao
shopping de uma única vez, estação de pagamento móvel, dentre outras soluções. “A
tecnologia permite maior interação com os clientes, comodidade e uma
experiência marcante”, resume Danilo Nascimento, Chief Operating Officer (COO) da
Payparking. “Nada mais importante que investir em simplicidade, conveniência e
segurança”, acrescenta.
Ferramenta
para o marketing
Investir no estacionamento também gera ganhos para o
marketing. “Você de fato cria e desenvolve relacionamento um a um”, afirma
Nascimento. Ele explica que, com o tempo, os shoppings perceberam que ao
receber bem os frequentadores logo no estacionamento, eles tendem a permanecer
mais no mall e, por consequência, a comprar mais. Segundo ele, com a cancela
abre-se também uma porta de comunicação com o frequentador. “A área de
marketing passa a interagir com seus consumidores, pois é possível fazer
promoções exclusivas e direcionadas”, explica. Uma estratégia, diz, é atrair o
cliente em dias de baixa rotatividade, oferecendo descontos ou o isentando do
pagamento do estacionamento.
Com tecnologia no estacionamento, o shopping consegue
personalizar a experiência. Um exemplo é uma plataforma da WPS que identifica o
frequentador assim que ele entra no estacionamento. “Por meio de uma plataforma
que gera benefícios, é possível criar uma relação direta com cada cliente,
identificando o perfil de consumo e promovendo ações de marketing individuais”,
afirma Ferreira, gerente de marketing e sales da companhia. Ao inserir o cartão
no terminal de entrada do estacionamento, o frequentador recebe uma mensagem
personalizada em um display LCD
posicionado na ilha de entrada.
Multiplicadores
Em shoppings em que não há muito espaço, as soluções
podem ajudar a aumentar o número de vagas.
O Grupo Krebs aposta em multiplicar as vagas e impedir que o cliente vá
embora. “Manter essa facilidade é fundamental para fidelizar o cliente e atrair
mais público”, diz Gilberto Camargo, gerente de vendas da companhia. “As
empresas já perceberam a diferença que uma solução adequada de estacionamento
fornece para atrair mais público e fidelizá-lo. Eles só não tinham muitas
opções para resolver a questão”, considera. Uma das soluções da companhia é o
GridPark, que verticaliza o estacionamento, oferece automação e um sistema de
gestão que permite acompanhamento e análise em tempo real para gestores, com
taxa de ocupação, custo relativo por vagas e outras informações.
O Portal Parking também aposta na multiplicação de
vagas. “Apostamos como nova tendência o uso de multiplicadores de vagas ou
estruturas robotizadas por ter custo inferior ao de uma construção convencional,
sem aumentar a área ocupada e sem restrições de ocupação e incidência de IPTU.
Essas soluções têm se apresentado como viáveis e já são realidade em alguns
empreendimentos”, afirma Braz, diretor da companhia.
Dá
para fazer mais
Apesar de todos os investimentos, é possível fazer mais. “A experiência no
estacionamento pode refletir nos usuários uma visão positiva ou negativa do
empreendimento como um todo, mas constatamos que muitos operadores ainda se
limitam a disponibilizar vagas legais ou investir em automação na cobrança,
para melhorar o controle da receita. Ou seja, sentimos a falta de prioridade ou
mesmo de planejamento de soluções diferenciadas que busquem implantar no
estacionamento elemento de exclusividade”, avalia Braz.
Mas tem muita gente trabalhando. Não à toa as empresas
que fornecem serviços de estacionamentos vêm crescendo. A Moving Vinci Park,
por exemplo, que administra cerca de 1.600 vagas, conseguiu elevar o
faturamento em 40% no ano passado, para R$ 100 milhões. “A empresa sempre mira
o futuro. Nos 14 países que estamos presentes, realizamos investimentos maciços
em novas tecnologias para a melhor gestão das operações de estacionamentos”,
afirma Flávio Echer, diretor de operações da companhia. Ele aponta que o grande
desafio hoje, para qualquer empresa, é manter uma consistência em seus
processos e garantir uma alta qualidade no serviço prestado. “A Moving, por
meio da sua sócia Vinci Park, está implantando no Brasil uma plataforma de
desenvolvimento de colaboradores, por meio de uma ferramenta de e-learning, a qual possibilita o
treinamento dos mais de 1.500 colaboradores da empresa, que estão distribuídos
em 18 cidades e oito estados brasileiros. Essa ferramenta permite que os colaboradores
estejam permanentemente informados, atualizados e preparados para exercer suas
atividades e garantir a qualidade nos serviços para os shopping centers”,
comenta.
Os lançamentos também não param. A Hub Parking
Technology acabou de lançar linha de máquinas de pagamento automático de
estacionamento, que reúne vários serviços de pagamento automático ou pagamento
manual e que são simples de serem instaladas e operadas, pois requerem menos
infraestrutura de cabeamento e fiação e consomem menos energia. O equipamento,
chamado de ParQube, vem com uma plataforma que permite gerenciar múltiplos
estacionamentos e diferentes tipos de equipamentos da empresa com uma única
interface web.
Segundo Silva, da ParkEyes, os empreendimentos têm dado
atenção ao tema, mas ainda encontram resistências em relação à área
construtiva. “Os investimentos em um estacionamento realmente profissional
ainda são significativos”, afirma. “Mas ele é a porta de entrada para todos os
clientes e é a primeira impressão que eles têm do shopping”, lembra. Para Braz,
do Portal Parking, tem aumentado a consciência por grande parte dos
empreendimentos sobre a importância do estacionamento para a geração de lucros.
No fim das contas, é um caminho sem volta. “Os shoppings adotarão muitas destas
novidades nos próximos anos, até como forma de maximizar resultados do
estacionamento, compensando as possíveis perdas com redução de aluguéis em
tempos de crise”, reforça Braz.
*Matéria
publicada na edição 200 da revista Shopping Centers, da Abrasce